sábado, 29 de setembro de 2007

E se jornalistas avaliassem estudantes de jornalismo?

Marcelo Tavela - A Ordem dos Advogados do Brasil, seccional do Rio de Janeiro (OAB-RJ), divulgou esta semana o resultado do seu exame, necessário para que os formandos em Direito possam exercer a profissão. E 90% dos inscritos foram reprovados. “Esse resultado só pode ser creditado ao mal preparo acadêmico e coloca em xeque o ensino jurídico”, diz Wadih Damous, presidente da OAB-RJ.

Outras razões apontadas são a formação de base deficitária e a grande quantidade de faculdades espalhadas pelo País. “Quase todo dia um curso novo é autorizado. O MEC [Ministério da Educação] não tem cumprido sua obrigação”, aponta Damous. Os motivos não são estranhos ao jornalismo e podem levantar a discussão: seria possível criar um exame semelhante?

Ao entrar e sair da faculdade, os alunos já fazem o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade), um dos mecanismos que compõem o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes), que mira mais nas universidades. Não há avaliação feita pela própria classe.

Entidades“Isso nunca foi alvo de discussão. Os advogados são profissionais autônomos, com uma qualificação determinada, e a OAB tem que oferecer garantias de competência técnica e jurídica. No jornalismo, quem avalia é o mercado. Nenhuma empresa contrata quem não for qualificado”, avalia Maurício Azêdo, presidente da Associação Brasileira de Imprensa (ABI). “O mercado será sempre o árbitro da qualificação”.

Sérgio Murillo, presidente da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), informa que a entidade não tem poderes legais para fazer a avaliação. “E nem os sindicatos. Isso seria atribuição do Conselho Federal de Jornalismo. A qualidade do ensino é uma preocupação, e há uma reivindicação da categoria de se avaliar as escolas. No projeto [do Conselho] não consta essa avaliação. Mas estabelecendo o Conselho, um exame pode ser discutido”, diz.
Murillo prevê um possível efeito colateral: “Seria criada uma indústria de cursinhos, como já acontece com a OAB, que não me agrada. O importante é ter um conselho. Hoje, estamos na mão do Estado. Queremos autonomia.”

No caso da OAB, o exame, como é feito hoje, foi regulamentado pela Lei 8906, de 1994. “Antes, o aluno poderia ser liberado demonstrando prática jurídica em um escritório modelo chancelado pela OAB”, explica Wadih Damous. “Para qualquer outra categoria ter um exame similar, seria preciso uma lei. No nosso caso, foi um inciso”.

ProfessoresEntre professores universitários, um exame semelhante ao da OAB divide opiniões. “Eu vou na contramão dessa idéia. O jornalismo trabalha no campo da cidadania, e há cada vez mais uma demanda de se flexibilizar ao máximo, com blogs e outras ferramentas. Você precisa de um controle social, e não de um funil de profissionais. Seria um exame corporativista”, enfatiza Ivana Bentes, diretora da Escola de Comunicação da UFRJ.

“Olha, eu acho interessante. O Enade e outras classificações avaliam a escolas, e não os alunos, que só contam com o registro no Ministério do Trabalho. Não teria por que ser contra um exame tipo o da Ordem. A analogia é muito boa”, opina Helio Schuch, chefe do departamento de jornalismo da UFSC . “Os estudantes já são certificados pela universidade. Se fossem certificados por mais um exame, o mercado teria mais um indicador confiável”, completa.

Márcia Vidal, chefe do departamento de Comunicação Social da UFC, também vê com bons olhos a idéia. “Acho que visa melhorar a qualidade profissional. Seria uma boa forma. Mas teria que ser uma prova prática, com produção de reportagem. Na nossa área, a avaliação se dá pelas qualidades práticas”, sugere.

E os alunos?Talvez os principais interessados nisso, a discussão sobre como mensurar a qualidade dos cursos já é feita por alguns estudantes. A Executiva Nacional dos Estudantes de Comunicação Social (Enecos) já propôs outras formas de avaliação, porém como alternativa ao Enade.

“Há um debate. A avaliação pode acabar fazendo um funil no final, que não vai resolver. Há universidades que fazem cursos pré-Enade, e acaba não representando a realidade. A educação tem que ser de qualidade e formar bons profissionais, caso contrário o prejuízo maior é do estudante, que só vai descobrir isso depois de quatro anos de faculdade”, aponta Arthur William, da comissão gestora da Enecos no sudeste e aluno da PUC-Rio.

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